Sempre
fui de me apegar às pessoas. Por isso sempre tive muitos amigos e amigas. Com
os namorados não era diferente. Mas com Antônio era.
Tudo
com ele era bem diferente. Meu apego a ele teve uma reação na mesma proporção,
eu diria. Eu soube disso quando transcorria uma tarde de sexta.
Eu
estava na agência numa atividade frenética. Vendíamos pacotes turísticos e a
procura tornara-se cada vez maior. Aproximava-se o verão, o que bem explicava
toda aquela trabalheira. O telefone não parava de tocar e eu era obrigada a me
virar entre ligações, papéis, e-mails e clientes que entravam e saiam. No final
da tarde houve uma relativa trégua e aproveitei para esticar as pernas sobre
minha mesa.
Qual
não foi minha surpresa quando a porta de minha sala abriu e por ela Antônio
mete a cabeça “fazendo uso” daquele seu sorriso encantador e cativante. De um
salto pus-me de pé e, toda desajeitada e lutando para parecer asseada e bem
cuidada, passei as mãos nos cabelos desgrenhados e corri para ele. Abraçou-me
carinhosamente usando apenas um braço e, dando um passo para trás e mantendo
uma das mãos escondida nas costas, disse que me trazia uma surpresa. Presumo
que meus olhos brilharam porque lembro que meu coração dava cambalhotas de
alegria e felicidade.
Veio
lentamente para mais perto de mim e afinal me deixou ver o que trazia. Era uma
caixa embrulhada para presente em papel vermelho e fita branca. Um adesivo em
forma de coração prendia o laço da fita ao volume, e sobre o coraçãozinho
estava escrito: “Pra você”. Tomei-a de suas mãos e a abri; dentro uma variedade
de chocolates finos. Estava tão agradada com aquela dupla surpresa que não tive
outra coisa a fazer senão agradecê-lo com um longo e molhado beijo.
Depois
explicou-me que no hospital tudo ia bem e que por isso conseguira sair mais
cedo. Uma hora depois caiu a noite e saímos todos da agência para um drinque.
Eu estava extasiada; sentia-me completa, inteira, plena, mulher. A companhia de
Antônio dava sentido à minha vida e uma sensação de segurança que eu jamais experimentara.
Ele não era ciumento e tomou como seus meus mais queridos e amados amigos.
Os
dias se seguiam como um belo rio de águas plácidas e margens ajardinadas. Eu
afinal tinha paz, tranqüilidade, alegria e plenitude. Que poderia mais querer?
Antônio às vezes ia à minha casa e à casa de outros de meus parentes, tios,
primos, avós. Minha mãe nutria por ele uma admiração especial e, quando o
encontrava, o cercava de todas as paparicações possíveis. Ao início ele se
sentia acanhado, mas depois resolveu tirar um bom proveito de seus agrados. Meu
pai, apesar de seu jeitão esquisito, era grato a ele por ter lutado com tanto
zelo pelo restabelecimento da saúde de seu pai, meu avô. E, para falar a
verdade, Antônio rompera todas as eventuais barreiras que porventura pudessem
existir antes mesmo de iniciarmos o namoro – meus familiares o idolatravam.
Aproximava-se
dezembro e as festas de fim de ano. Antônio já me avisara, quando de sua
primeira viagem para visitar os filhos, que voltaria a vê-los no ano novo. Apesar
de nosso relacionamento estar mais firme e do grau de confiança que se
estabelecera entre nós, meus sentimentos quanto à questão dos filhos em nada
amainara. Meus problemas iniciavam tão logo a ideia dos filhos me trazia a essa
realidade inexorável. Só em pensar nisso tinha náuseas e uma enorme sensação de
impotência se apoderava de mim. Era uma coisa com a qual eu não sabia lidar e
duvido mesmo que desejasse lidar. Via essa situação da forma mais negativa possível.
Eu
não tinha a menor ideia de como iam as coisas do “outro lado”, e nem queria
saber. Eu pensava apenas o seguinte: - esse cara vai ser meu de vez custe o que
custar. Não abrirei mão dele por nada desse mundo. Eu tinha a segura e firme
sensação de que ele já não conseguiria viver sem mim, mas a verdade é que o
ambiente em que vivíamos era todo propício.
O mesmo não se
poderia dizer de seu ambiente nativo. Eu não sabia a que influências ele se
sujeitava, se tinha a coragem necessária para levar a cabo o que se propunha,
isto é, divorciar-se. Acho que nem ele pensava naquilo, e é bem possível que
estivesse apenas curtindo uma temporada comigo, uma mulher linda, inteligente,
bem relacionada.
Meus problemas
eram mais sérios do que eu mesma supunha, e só viria a conhecê-los plenamente
em pouco tempo. Eram problemas que eu carregava comigo como uma tralha
emocional mal resolvida e que só viriam a se revelar em situações de estresse
afetivo e emocional de outra origem, como numa vida em que eventualmente
coabitasse com um companheiro, por exemplo.
Porém, mais
uma vez minha confiança foi às alturas quando Antônio me anunciou: não mais
viajaria nas festas de fim de ano para ver os filhos; ficaria comigo.
O que me
passou despercebido foi o fato de que ele iria embora de vez no final de
fevereiro próximo. Não atentei para esse detalhe. Ele agia como se fosse passar
mais tempo comigo apenas para compensar a proximidade do fim definitivo. No fundo
eu tinha esse evento em perspectiva, mas o guardava em algum lugar da mente
onde não o pudesse apreciar. Tanto que quando fomos obrigados a encará-lo os
desentendimentos entre nós se amiudaram. Eu começaria em breve a pressioná-lo
como jamais fizera. Dias negros estavam para chegar.
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